Foto: Stephanie Gonot
“Epidemia de Transgêneros: o que está acontecendo com as nossas crianças?”, esse é o tema da palestra promovida pelo deputado estadual Eric Lins (DEM) e agendada para Assembleia Legislativa no próximo dia 18 de março.
A palestrante do evento, psiquiatra Akemi Shiba, contrariando organizações internacionais e o próprio Conselho Federal de Medicina, dissemina um discurso discriminatório e sem qualquer embasamento científico.
Nos causa estranheza que se despenda dinheiro público para a realização desse tipo de evento, que não trará benefício algum à sociedade e muito menos à população trans.
Não estamos vivenciando uma “epidemia de transgêneros”. Não há qualquer evidência que comprove isso. Inclusive, em termos proporcionais, o número de pessoas transgêneras é absolutamente menor em relação a pessoas que não são trans.
Tratar a transexualidade como doença é regredir em avanços conquistados por essa parcela da população. Desde 2018, a Organização Mundial da Saúde deixou de classificar a transexualidade como disfunção mental e a mesma já não consta no capítulo de transtornos mentais da Classificação Internacional de Doenças (CIDs).
Transexualidade não é doença e não pode e nem deve ser tratada como tal.
Ao defender a transexualidade como doença, indo contra o que defende a OMS e o CFM, Akemi pode ser enquadrada na lei de racismo, que desde 2019, após uma decisão do STF, passou a englobar também a LGBTfobia. Segundo o advogado Paulo Iotti, responsável pela ação no STF que criminalizou a LGBTfobia, a psiquiatra praticou crime ao induzir ou incitar o preconceito (art. 20 da Lei 7716/89).
A população trans está sujeita a inúmeras vulnerabilidades psicossociais associadas às experiências de violência, preconceito e exclusão social, que impactam negativamente na saúde mental dessas pessoas, que enfrentam problemas como depressão, ideação suicida, ansiedade, síndrome do pânico e stress pós-traumático.
Ao contrário do que se pensa e que a palestrante propaga, os procedimentos médicos de afirmação de gênero (cirurgias e terapia hormonal) não são de fácil acesso. Para que as pessoas trans possam recebê-los no sistema público, elas passam por inúmeras barreiras, que incluem longas filas de espera, número escasso de recursos humanos habilitados tecnicamente para as demandas específicas de saúde, além do preconceito profissional.
Pessoas trans, muitas vezes, apresentam sofrimento, estresse e mal-estar relacionados aos seus corpos, a chamada disforia de gênero. Há evidências de que esse desconforto pode ser disparado por gatilhos externos como pressão social por conformidade corporal e vivência sistemática de julgamentos no convívio social.
Vale ainda destacar que a tão falada “Ideologia de Gênero” não existe. Ela não é reconhecida pela comunidade científica (nacional e internacional), nem pelas pessoas trans/LGBTs. Assim sendo, a hipótese de “contágio” social/midiático (crianças e adolescentes sendo “incentivadas” a serem trans) é uma informação descabida e preconceituosa.
Falar em “epidemia de transgêneros” denota níveis estarrecedores de preconceito e ignorância. É vergonhoso usar como plataforma político-partidária uma parcela da população que é constantemente colocada em situação de vulnerabilidade.
Departamento de Gênero e Diversidade
CPERS/Sindicato