Novo currículo do Ensino Médio gaúcho é retrocesso civilizatório (por Helenir Aguiar Schürer)


Helenir Aguiar Schürer (*)

Há quase quatro anos, escrevi em artigo para o Sul 21: “Se a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) for implementada, nossa próxima luta não será por salário ou reposição da inflação. Será por emprego.” Este dia está chegando.

Como tantos outros projetos recentes que parecem ter sido gestados para acabar com o que resta do país e aumentar nossa colossal desigualdade, a Reforma do Ensino Médio passou e, já neste semestre letivo, será implementada nas escolas estaduais gaúchas. Aqui assumimos a vanguarda do atraso, piorando o que já era muito ruim.

O governo não apenas ignorou as demandas da comunidade escolar e os inúmeros problemas apontados por pesquisadores da área como – me apropriando da crítica realizada pelo Grupo de Pesquisa Filosofia, Cultura e Educação (Filjem) da UFSM em nota de repúdio – “maximizou a minimização do mínimo” já previsto na base nacional.

A nova matriz curricular restringe, por exemplo, Filosofia e Sociologia a apenas um ano do Ensino Médio, com aulas uma vez por semana. História, Geografia, Espanhol e Artes terão destino semelhante. E, em tempos de amplo debate sobre a saúde pública, Educação Física foi relegada somente ao 1º ano, também com um período semanal.

Estudantes da rede estadual terão acesso ao que é estritamente necessário para ingressar em um mercado de trabalho cada vez mais precarizado, que obriga trabalhadores a se tornarem empreendedores de si mesmos, sem direitos nem carreira. Que chances terão nossos alunos de acessar o Ensino Superior enquanto estudantes da rede privada desfrutam do menu completo de disciplinas?

Trata-se de um verdadeiro apartheid socioeducativo, projetado para transformar jovens em massa de trabalho acrítica, sem formação humanística e pronta para servir a interesses empresariais. Mão de obra barata para a estratégia neoliberal de superação da crise do capital.

Como sempre, a resistência deverá partir do chão da escola. É urgente resgatar a primazia da gestão democrática e exercer a autonomia para construir projetos político-pedagógicos que contemplem as reais necessidades da comunidade escolar e não deixem docentes para trás.

Mas a responsabilidade pela luta não pode recair somente sobre as comunidades escolares. A escola que defendemos e precisamos reconstruir dependerá de restabelecer, pelo poder do voto, governantes comprometidos com a formação integral do cidadão, com o bem-estar social e com uma nação mais justa e igualitária.

Esta é uma tarefa que caberá a toda a sociedade.

(*) Professora da rede estadual e atual presidente do CPERS-Sindicato

Artigo publicado no Sul 21

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