A PEC 241 e as três teses liberais equivocadas sobre o Estado brasileiro (parte I)


A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241/2016 propõe a instituição de um Novo (porém não necessariamente melhor!) Regime Fiscal, a vigorar por vinte exercícios financeiros seguidos. Para tanto, o texto fixa, em cada ano, um limite individualizado para a despesa primária total do Executivo e demais poderes da esfera federal.
Para 2017, o limite será calculado pela aplicação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-IBGE) à despesa primária realizada no exercício de 2016. Para os anos posteriores, o valor do limite referente ao exercício imediatamente anterior, corrigido pela inflação. Para fins de verificação do cumprimento do limite estabelecido a cada ano, será considerado o somatório das despesas que afetam o resultado primário no exercício, incluídos os restos a pagar referentes às despesas primárias.
No caso de descumprimento do limite estabelecido, o Poder Executivo deverá ajustar-se já no exercício subsequente, por meio do congelamento de subsídios e vedando a ampliação de desonerações tributárias que provoquem renúncia de receita. Por fim, a PEC afirma que as vedações introduzidas pelo Novo Regime Fiscal não constituirão obrigação de pagamento futuro pela União ou direitos de outrem sobre o erário.
A motivação fundamental da PEC está expressa no item 8 da Exposição de Motivos que acompanha o texto da lei (EMI nº 00083/2016 MF MPDG). Embora careça de comprovação teórica e empírica, explicita-se a ordem causal irreal de suas suposições da seguinte maneira:
“Com vistas a aprimorar as instituições fiscais brasileiras, propomos a criação de um limite para o crescimento das despesas primária total do governo central. Dentre outros benefícios, a implementação dessa medida:aumentará a previsibilidade da política macroeconômica e fortalecerá a confiança dos agentes; eliminará a tendência de crescimento real do gasto público, sem impedir que se altere a sua composição; e reduzirá o risco-paíse, assim, abrirá espaço para redução estrutural das taxas de juros. Numa perspectiva social, a implementação dessa medida alavancará a capacidade da economia de gerar empregos e renda, bem como estimulará a aplicação mais eficiente dos recursos públicos. Contribuirá, portanto, para melhorar da qualidade de vida dos cidadãos e cidadãs brasileiro. (grifos nossos).”
Trata-se, sejamos claros, do infeliz encontro entre a ignorância, a insensatez, a arrogância e a má-fé.[1] Segundo esse entendimento, a proposição resolverá – a um só golpe – o problema fiscal, que considera estrutural e insolúvel nas condições vigentes, e com ele o que considera problemas crônicos do Estado brasileiro, pois o chamam de grande, ineficiente e quase comunista, ou seja, contra os interesses do rei-mercado!

Este pequeno artigo busca questionar e invalidar tais argumentos.

1. O Estado brasileiro é grande?
Ora, grande em relação a quem? Grande em relação a quê? A resposta depende do tamanho da ambição, da ousadia, do escopo, do perfil do projeto de desenvolvimento nacional almejado. Significa que o problema não é o tamanho do Estado em abstrato, mas sim qual o arranjo institucional necessário (Estado/Mercado/Sociedade) para levar a cabo o projeto de desenvolvimento pretendido.
Em perspectiva desenvolvimentista – que envolva um projeto includente, sustentável, soberano e democrático – o Estado brasileiro decididamente não é grande! Pelo contrário, sua ossatura e seumodus operandi são de índole liberal, está assentado – por incrível que pareça! – numa concepção de Estado mínimo! Significa que suas lógicas de organização e funcionamento trabalham sempre abaixo do potencial. Assim, a ineficiência do Estado decorre da contradição latente entre os projetos de ambição desenvolvimentista e os instrumentos de governo de cunho liberal. O sistema financeiro pressiona para dificultar ou bloquear o gasto público real, mas deixando praticamente livre de restrições o gasto público financeiro que sustenta o pagamento de juros aos rentistas de plantão.
Apenas dois indicativos bastam para demonstrar que o Estado brasileiro não é grande. São a carga tributária brasileira e o percentual dos trabalhadores empregados no serviço público, ambos em perspectiva internacional – vide gráficos 1 e 2 abaixo. A participação da arrecadação fiscal no PIB brasileiro não carrega o exagero que os analistas liberais costumam acentuar. O mesmo pode ser dito a respeito do tão propalado “inchaço” de nosso setor público – o percentual de servidores no total da força de trabalho situa-se abaixo de países assemelhados.

pec-02

*Gráfico 2: Empregos no setor público

Capacidades estatais e instrumentos governamentais, porquanto potentes no caso brasileiro, não trabalham sob a lógica do desenvolvimento (includente, sustentável, soberano, democrático), e sim sob constrangimentos jurídicos e liberais do Estado mínimo, construídos e aplicados cotidianamente para impedir ou dificultar o gasto público real, seja em políticas sociais ou em investimentos estatais. Hoje em dia, talvez a Lei n. 8666 (Lei das Licitações – grande dificultadora das contratações públicas), a Lei de Responsabilidade Fiscal (grande limitadora dos gastos reais em favorecimento do gasto financeiro) e a postura dos órgãos de controle, sejam bons exemplos para as afirmações precedentes. Estes últimos têm revelado maior preocupação em realizar auditorias de conformidade e foco em aspectos triviais da gestão pública para a racionalização de gastos e busca por eficiência, ao invés de preocupação mais ampla sobre a eficácia e a efetividade das ações governamentais.

**Acompanhe, nesta quinta-feira, dia 15, a continuidade desta análise.

Fonte: Carta Maior

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