Irregularidades da nova matriz curricular pautam debate na Comissão de Educação da Assembleia


Nesta terça-feira (10), a Comissão de Educação da Assembleia Legislativa debateu a nova matriz curricular imposta pelo governo Leite (PSDB).

A presidente da Comissão, deputada Sofia Cavedon, lamentou a ausência da Secretaria Estadual de Educação (Seduc). “Apesar de terem confirmado, nos informaram que não poderiam participar. É inaceitável a ausência do governo em um momento em que todas as escolas do Rio Grande do Sul questionam a implantação da nova matriz curricular”, observou.

Sofia fez questão de lembrar que o diretor pedagógico da Seduc, Roberval Furtado, durante reunião realizada na semana passada, desmereceu a atuação e a autonomia do Conselho Estadual de Educação (CEED). “Governos autoritários não gostam de Conselho. Não é possível compreender esta padronização que insistem em implementar. O Conselho Estadual de Educação, desde o início, deixou claro que não concorda com a nova base curricular”, frisou.

Antonio Saldanha, representante do CEED, relatou que há um movimento de intervenção no Conselho. “A Seduc ameaça a autonomia do Conselho. Nós lutamos pela garantia do direito de acesso à educação aos que mais precisam, por isso não admitiremos que estes ataques continuem”, afirmou.

Ele observou também que o cenário atual condena diversas gerações a não terem as mesmas oportunidades que os alunos de escolas privadas. “Enquanto a educação pública reduz disciplinas importantes, a escola privada mantém o mesmo número de períodos. Isso vai aumentar ainda mais a distância entre quem se forma na escola privada e quem conclui o ensino nas instituições públicas”, alertou.

“Não houve discussão com as comunidades, simplesmente disseram que tem que ser implementado e deu. A lei da gestão escolar não pode ser rompida assim”, salientou.

“As portarias não têm nada a ver com o referencial que construímos. A Seduc em momento algum nos contatou para dialogarmos. A única comunicação foi a imposição. O governo está tirando da comunidade a construção de seu processo pedagógico. O que está estabelecido é um regimento padrão, que desrespeita totalmente a posição do Conselho”, avaliou a representante do CPERS no CEED, Marli da Silva.

A diretora do Departamento de Educação do CPERS, Rosane Zan, classificou a imposição da nova matriz como um desrespeito total à autonomia das escolas. “Querem implementar uma educação de mercantilização, voltada apenas para o mercado e sem pensar nos alunos. Precisamos, mais do que nunca, defender a escola pública autônoma e heterogênea”, afirmou.

Para a secretária-geral do CPERS, Candida Rossetto, o cenário é de autoritarismo. O rompimento com o Conselho de Educação, o começo do ano letivo com falta se professores, o fechamento de turmas e turnos, todo esse movimento do governo demonstra a intenção de mercantilização da educação pública. Defendemos uma educação que vai além do capital, uma educação humanizadora”, afirmou.

Margot Andres, diretora do Sinpro, destacou que o sindicato defende a escola pública porque entende que ela tem que ser uma opção e não uma falta de oportunidade.  “A educação pública precisa ser de qualidade, pois é a base de um país. A matriz curricular precisa ser construída com suas comunidades, pois não existem escolas iguais. A nova matriz é a segregação da sociedade”, considerou.

Angela Burgos, da AOERGS, frisou que defender a escola pública é estar ao lado da comunidade e buscar o melhor para os alunos.  “Quando o Conselho faz um apontamento e o governo vai na direção contrária é um sinal de alerta muito forte”, enfatizou.

Desnise Grosso da Fonseca, do Grupo de Estudos de Currículo da Escola de Educação Física da UFRGS, falou sobre o novo ensino médio e destacou que esta é a etapa final da educação básica que tem como perspectiva a formação dos estudantes para a inserção no mundo do trabalho. “Diferenças sociais e técnicas só se agravam com a forma com a qual essa fase do ensino vem sendo tratado. Somos atacados com uma reforma que irá ferir os princípios de uma educação integral. A construção dos itinerários formativos tem sido um processo de acerto e erro e as escolas ficam tateando sobre como proceder”, pontuou.

A presidente da Assers, Nina Ventimiglia Xavier, salientou que os educadores estão, a cada dia, recebendo uma orientação diferente e que isso reflete no cotidiano da escola e no planejamento. “É preciso defender a autonomia e a lei de diretrizes e bases. A escola tem que ser uma possibilidade de desenvolvimento e não de enquadramento dos nossos jovens. Um currículo é vida e não podemos deixar que seja determinada por um contexto sócio econômico neoliberal”, afirmou.

A promotora regional de educação do Ministério Público, Luciana Casarotto, lembrou que o CPERS já ingressou na justiça questionando a irregularidade das portarias. Frisou também que a questão da autonomia das escolas, principalmente no momento atual, chama a atenção. “Pelo visto faltou diálogo antes da publicação das portarias. Essa ideia de fazer algo padronizado nos traz o questionamento sobre como o governo irá fazer a gestão de em uma rede de 2500 escolas? Há um desafio enorme pela frente”, disse.

“As portarias chegaram no momento de greve contra o pacote do governo. Tão logo chegaram ao Conselho, colocamos nossa posição contra. Elas reproduzem a visão de enxugamento da educação que o governo quer efetivar. Precisamos reagir fortemente contra este desmantelamento e desorganização da escola pública”, alertou Lucia Camini, representante do CEED.

Escolas resistem

O Instituto Paulo Freire, de Uruguaiana, resiste firmemente à implantação da matriz. “Iniciaremos o ano letivo no próximo dia 16 com um quadro de pessoal ainda muito deficitário. O governo manda que façamos a avaliação de zero a dez e nós sempre fizemos parecer descritivo. E assim seguiremos. São as comunidades que definem a sua vida na escola, que definem a sua escola”, afirmou a diretora da instituição, Maria do Carmo Vitorino, que encaminhou à Comissão um documento relatando a posição da escola quanto às irregularidades da nova matriz.

A escola Canadá, localizada em Viamão, vem enfrentando problemas com a implantação da nova base curricular. A instituição possui diversas atividades com uma base curricular diversificada funcionando em turno integral. Com a padronização teria que diminuir a sua carga horária. “Não temos professor, supervisor, orientador. Precisamos dar conta de tudo e se não damos somos cobrados. Fala-se tanto em diversidade e a Seduc monta um sistema de gerenciamento que não aceita o currículo construído pela comunidade escolar”, desabafou a diretora da instituição, Patrícia Ribeiro de Oliveira.

“A lógica do mercado está galopando em nossas escolas. Me parece que isso tem um caminho bem claro, que é a privatização. O que estamos ouvindo do governo é que a nova base curricular está aí é que temos que nos virar, mesmo diante da falta gritante de profissionais, recursos e estrutura”, denunciou Fritz Roloff, da Associação Gaúcha de Professores Técnicos de Ensino Agrícola (AGIPTEA).

“Ainda em 2018 elaboramos um parecer que repudia a nova matriz curricular. Entre os nossos apontamentos ressaltamos o respeito a gestão democrática, a autonomia para elaboração dos referenciais curriculares e a participação no processo de construção e avaliação”, destacou Guilene Salerno, do Conselho Municipal de Educação (CME).

Comissão irá solicitar reunião com secretário de Educação

No final da reunião, ficou definido que será encaminhado para todas as escolas do Rio Grande do Sul o documento elaborado pelo Instituto Paulo Freire, junto com os pareceres do Ceed. “Para que as escolas tenham documentos legais e façam o contraponto ao governo”, explicou Sofia.

Também ficou estabelecido o convite para que as escolas e as comunidades escolares participem do Seminário de Educação, promovido pelo CPERS, no próximo dia 30, sobre a nova matriz curricular e o Fundeb. O local e o horário da iniciativa serão divulgados posteriormente.

Além disso, ficou acordado entre os participantes que a Comissão de Educação irá solicitar, de forma coletiva com as demais entidades, uma audiência com o secretário de educação, Faisal Karan, sobre as novas bases curriculares.

 

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