No dia 16 de abril, Eduardo Leite (PSDB) autorizou prefeitos a definirem suas próprias diretrizes de isolamento social. Naquela data, o RS contabilizava 873 casos e 21 mortes.
Hoje, 24 dias depois, o número de casos triplicou e as mortes quintuplicaram, chegando aos 100 óbitos. Não há sinais de recuo da pandemia em qualquer região do estado.
É neste cenário perturbador que o governador consolida sua nova estratégia, chamada de “distanciamento controlado”.
Trata-se de um complexo emaranhado de protocolos e recomendações territorializadas que, na prática, atuam como uma chave para a retomada das atividades.
Verniz científico
Mesmo abastecido de dados científicos robustos, incluindo a pesquisa da UFPel, o governador parece jogar contra a própria estratégia.
Em entrevista ao Jornal do Comércio no dia 23 de abril, o reitor e pesquisador Pedro Hallal ilustrou a contradição: “as deliberações do governo do Estado têm ouvido a opinião da ciência, mas obviamente são independentes.”
Em nota publicada no dia 15 daquele mês, o Departamento de Epidemiologia da universidade já alertava:
“(…) os resultados de nosso estudo de linha de base são insuficientes para direcionar a tomada de decisões, de qualquer natureza, no momento atual. De acordo com a grande maioria das entidades nacionais e internacionais (…) apoiamos a manutenção do distanciamento social, pelo menos até que novas evidências se tornem disponíveis.”
Para o doutor em virologia pela USP, Atila Iamarino, o plano de Eduardo Leite “pula um passo crucial”: a necessidade de adotar testes em larga escala.
“No Brasil, como um todo, tenho muita reticência na adoção de um plano desses, não porque um plano desses não seja importante, mas porque nós não temos testes o suficiente para saber exatamente o que está acontecendo aqui”, afirmou em entrevista ao Nexo Jornal.
A subestimação é tão grave que o mapa utilizado pelo Estado sequer acompanha os números oficiais dos municípios. Levantamento realizado pelo Sul 21 mostra que a região Norte do RS tem até quatro vezes mais casos do que o contabilizado pela Secretaria da Saúde.
Reconhecer e valorizar a pesquisa produzida na Universidade Pública é uma iniciativa louvável, em franco contraste com o obscurantismo negacionista do governo Bolsonaro. Mas de pouco adianta o verniz científico se os dados não têm consequência na estratégia de combate à pandemia.
É como reunir-se com o Sindicato, ouvir suas demandas e, meses depois, apresentar um plano de todo contrário aos interesses da categoria. E, ao fazê-lo, afirmar que “dialogou”.
Infelizmente, fala mais alto a responsabilidade de Eduardo Leite com os empresários(as) do que com o rigor científico.
Esperamos que este salto no escuro não resulte em tragédia. Como mostra a experiência internacional, o provável resultado será uma economia ainda mais combalida, muitas mortes e um novo período de reclusão, mais severo e duradouro.
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