Educar com consciência negra é construir pontes para um futuro digno


“Um educador ou educadora forma a juventude para o modelo de sociabilidade que almeja, por isso é preciso haver um sonho por trás de todo ato educativo.”

(Como ser um educador antirracista, de Bárbara Carine)

Assumir que o Estado brasileiro foi fundado no racismo e que as escolas, enquanto instituições concebidas por esta sociedade, reproduzem violência racial contra alunas(os) e trabalhadoras(es) da educação é o primeiro passo para que o poder público e as comunidades escolares encontrem caminhos para construir currículos, práticas pedagógicas e atitudes antirracistas. Da portaria à sala de aula, cada uma e cada um deve ser reconhecido e respeitado em sua completude e singularidade. No entanto, números preocupantes revelam um cenário bastante hostil à comunidade negra nos ambientes de ensino. 

Cerca de 70% das(os) brasileiras(os) entre 16 e 24 anos apontam a escola como o lugar onde mais sofrem racismo, segundo levantamento divulgado em 2023 pela Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec), pelo Instituto de Referência Negra Peregum e pelo Projeto SETA. Como o Brasil é também patriarcal e a opressão de gênero adiciona camadas ao racismo, 63% das pessoas que afirmaram enxergar a raça como a principal motivadora de violência nas escolas são mulheres negras. 

Tornar a educação um espaço seguro e acolhedor para crianças, jovens e adultas(os) pretas(os) passa, portanto, por uma série de revoluções. Em primeira instância, o incentivo à presença de educadoras(es) e estudantes negras(os), através do fortalecimento do sistema de cotas, é fundamental. “Onde a gente não se vê, a gente não se pensa, não se projeta”, escreve a autora do livro semifinalista do Prêmio Jabuti 2024 “Como ser um educador antirracista”, Bárbara Carine. 

O estímulo à leitura de intelectuais negros, como Milton Santos na Geografia, Achille Mbembe na História, Conceição Evaristo na Literatura, e tantas outras(os) que deram chão à luta racial, também expande a representatividade na educação. 

Outro ponto importante na realização de uma escola antirracista é o enfrentamento inflexível à intolerância religiosa. Dentro das escolas públicas, muitas(os) alunas e alunos são de terreiro, praticantes da Umbanda ou do Candomblé, e esbarram, ainda na infância, no preconceito de quem não sabe o tamanho da potência de sua ancestralidade. À medida que todas(os) estudantes são valorizadas(os) em sua integridade cultural por professoras(es), funcionárias(os) e equipe diretiva, a comunidade escolar como um todo entende que a sabedoria afro-brasileira é rica e legítima. 

Em vigor há mais de duas décadas, aplicação da Lei 10.639 ainda encontra barreiras 

Mesmo quando há legislação determinando uma proposta de currículo decolonial, como é o caso da obrigatoriedade do ensino da História e Cultura Afro-Brasileira nas escolas públicas e particulares (Lei 10.639), uma série de entraves prejudicam seu oferecimento: falta de letramento racial às comunidades escolares, carência de concurso público para especialistas, estagnação na renovação das equipes pedagógicas e ausência de cobrança da implementação da Lei por parte das secretarias de educação. De acordo com a pesquisa do Ipec, apenas 46% das(os) brasileiras(os) afirmam ter entrado em contato com estudos afro-brasileiros nas instituições de ensino. Ou seja, no país com a maior população negra fora do continente africano, menos da metade das pessoas conhecem a fundo o processo histórico do Brasil. 

Ainda, conforme os dados, só 37% dizem ter debatido sobre racismo no ambiente escolar. Mais uma vez, os números revelam a dificuldade de superação do preconceito racial na educação e a urgência de agir para fortalecer a aplicação da Lei 10.639. Por isso, revisitar a história oficial e levantar questionamentos sobre as letras dos hinos e sobre o porquê de reis e rainhas africanas(os) terem sido apagadas(os) das narrativas significa fazer cumprir uma política pública importantíssima e ter compromisso com uma aprendizagem qualificada. 

Para o CPERS, através do Coletivo Estadual de Igualdade Racial e Combate ao Racismo, todas as práticas antirracistas, quando somadas umas às outras, balançam as estruturas hegemônicas e oferecem à infância e à juventude negras as possibilidades de ocuparem espaços de poder, valorizarem suas trajetórias e conquistarem autoestima para enfrentar o mundo. É papel de toda(o) educadora(or), seja professora(or) ou funcionária(o) de escola, sonhar com um horizonte menos desigual e construir pontes para um futuro digno! 

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