São 6h20 e a diretora da escola Mário Quintana, de São Leopoldo, já está na instituição. Sem merendeira, sem vice-direção, sem supervisão e sem orientação, Eliza Weber trabalha por cinco. Até a portaria é dividida entre os profissionais.
Não bastasse a precarização, desde o início do ano a escola funciona apenas pela manhã. O turno da tarde foi encerrado por ordem do governo Eduardo Leite (PSDB).
Para receber os estudantes do 1º ao 5º ano, Eliza começa sua rotina diária limpando os banheiros. Terminada a tarefa, higieniza-se e vai preparar a merenda, que ela mesma precisa entregar aos alunos.
“Depois que dou o lanche, limpo as mesas e a cozinha. Neste ano, até agora, só consegui servir lanches. Ano passado, mesmo sem merendeira, servíamos comida. Gostaria de servir o arroz e o feijão que eles tanto gostam, ainda mais que muitos fazem a principal refeição aqui. Mas estou num esgotamento total”, desabafa.
Encerrada a hora da merenda, a diretora auxilia o secretário a cuidar do recreio no pátio. Somente após o intervalo ela consegue se dedicar às demandas da direção escolar. “Quando termina o recreio já estou exausta e aí vem todo o trabalho específico da direção, o atendimento aos pais e todas as outras atividades”, descreve.
Mesmo com aumento de demanda, escola teve turno fechado
A Mario Quintana está localizada em uma área residencial densa, com condomínios que nos últimos meses têm recebido novos moradores. A procura por vagas na escola aumentou. “Neste ano a procura cresceu, pois são mais famílias morando no entorno e muitas que estão vindo de escolas privadas. Não consigo absorver porque nos tiraram um turno. A escola mais próxima também está lotada. Como vai ficar o atendimento a essas crianças?”, questiona Eliza.
O comunicado sobre o fechamento do turno da tarde foi informado por e-mail. Não houve diálogo, mesmo com a reiterada insistência da diretora em conversar sobre a necessidade de manter a escola funcionando nos dois turnos. “Em nenhum momento fomos chamados para conversar, apenas bloquearam as matrículas no sistema”, recorda a diretora.
Delmar José Hanauer, presidente da Associação do condomínio São Miguel e Charrua, próximo à escola, lamenta o descaso com a instituição na qual estudaram seus três filhos. “Criei meus filhos aqui, tiveram uma formação muito boa. Esta escola tem uma particularidade que é a relação afetiva com as crianças, os pais e a comunidade”, afirma.
Ele se diz surpreso com os enxugamentos feitos na instituição, mesmo com a crescente demanda de alunos. “São atitudes sem explicação. A procura pela tem aumentado e vai crescer ainda mais”, observa.
A presidente do Círculo de Pais e Mestres, Zelia Beatriz Korschner, também demonstra preocupação. Com duas filhas na escola e ciente da importância da instituição para a comunidade, ela teme que o governo queira fechar as portas da Mário Quintana.
“Fico bem preocupada, pois se fecharem não sei pra onde vão mandar minhas filhas e as demais crianças estudarem. Aqui é perto e prático para todo mundo. Além disso, ficamos seguros pois sabemos que são bem cuidados”, destaca.
De acordo com levantamento do 14º Núcleo do CPERS, que tem lutado ferrenhamente junto com educadores e comunidade, há ainda pelo menos três escolas em São Leopoldo e duas em Novo Hamburgo que estão sob ameaça de encerramento de turnos.
“Através da mobilização que realizamos junto com as escolas e as comunidades, conseguimos impedir o fechamento de sete instituições. Nossa luta não vai cessar. Seguiremos juntos para impedir o desmonte da educação pública”, afirma diretor do núcleo, Luiz Henrique Becker.
Mesmo diante dos obstáculos, a diretora que a comunidade elegeu para estar à frente da escola não arreda o pé de lutar para que a Mário Quintana siga de portas abertas educando com qualidade, amor e zelo.
“Tentam fazer com que a gente se sinta incompetente, é uma tristeza muito grande. Mas essa escola é vital para esta comunidade e eu sou a diretora com muito orgulho, Sou educadora, escolhi isso para a minha vida, criei meus filhos assim. Só saio daqui se me tirarem“, finaliza.
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