“Nossas crianças correm risco”: CPERS e comunidades escolares denunciam os riscos da municipalização em reunião com a Seduc


Uma comitiva formada pela direção do CPERS e por representantes de diversas comunidades escolares de Porto Alegre esteve, nesta quarta-feira (3), na sede da Secretaria Estadual da Educação (Seduc) para denunciar os impactos da municipalização de escolas estaduais e exigir que o governo considere a realidade e a segurança das crianças antes de impor qualquer mudança.

A resistência à municipalização não é novidade para o CPERS: há anos o Sindicato trava esse embate em defesa das comunidades escolares. Em diferentes governos, mas com mais intensidade na gestão de Eduardo Leite (PSD), a categoria já conseguiu barrar fechamentos e transferências arbitrárias e segue vigilante para impedir retrocessos que prejudiquem estudantes, famílias e educadoras(es).

A reunião foi aberta pela presidente do CPERS, Rosane Zan, que destacou a gravidade do tema e o histórico de resistência das comunidades. “Sempre levamos em consideração o território em que o aluno está inserido. Aqui, temos pais, avós, diretoras, e isso mostra que não se trata apenas de postos de trabalho, mas da defesa da escola pública onde as comunidades existem. Não há sensibilidade da Seduc, porque se há mobilização da comunidade, não se pode mexer”, afirmou.

A diretora do 39º Núcleo do CPERS, Neiva Lazzarotto, reforçou a falta de transparência e diálogo. Segundo ela, as comunidades só tomaram conhecimento da lista de escolas incluídas na municipalização quando tentou realizar inscrições no sistema estadual. “Começamos com 21 escolas na lista. Após muita luta, ainda restam nove. As famílias foram surpreendidas e sequer conseguem fazer a matrícula”, denunciou.

Representantes de núcleos e escolas alertaram para os graves riscos. A tesoureira do 38º Núcleo, Maria Amália Santos de Oliveira, classificou como “gigantesco” o potencial de evasão escolar caso as mudanças sejam implementadas sem considerar a realidade local. “É preciso ouvir as comunidades”, cobrou.

A diretora da EEEF Araújo Viana, Fernanda Remião Schneider, emocionou-se ao relatar o trajeto entre sua escola e a EMEF Professora Judith Macedo de Araújo, percurso que estudantes seriam obrigadas(os) a fazer diariamente. “Existe uma zona de risco do tráfico e uma lomba muito grande. As famílias já enfrentam muitas dificuldades. Temos crianças em vulnerabilidade social. Não consigo imaginar nossos alunos subindo essa distância todos os dias. Por que vamos adicionar mais uma barreira à vida dessas famílias?”, questionou a educadora.

“Temos uma grande preocupação que com aumento da distância até a outra escola, subida muito íngreme e problemas de segurança pública, tenha muita dificuldade para as famílias, separação de irmãos e desistência das crianças, aumente a evasão escolar. Como a SEDUC ignora essa realidade?”, questionou a diretora da EEEF Luiz de Azambuja Soares, Kátia Bueno Laner.

“Não é somente a distância, se vocês fizerem isso, estarão decidindo o futuro do meu filho, porque, infelizmente, devido ao tráfico, ele não pode estudar em qualquer escola. O que eu vou fazer com meu filho? E com o meu neto? Eu só quero que eles tenham a chance de um futuro melhor, que não tenham que ‘limpar o chão’ como muitos dizem. Peço que escutem a comunidade antes. Além da evasão, vai ter mãe que não vai conseguir nem trabalhar”, desabafou, emocionada, uma das mães presentes. 

Diante das denúncias, a secretária Raquel Teixeira tentou justificar o processo com base no novo Marco Legal, que define a responsabilidade dos municípios sobre os Anos Iniciais do Ensino Fundamental. As participantes, no entanto, rebateram que a legislação não pode ignorar contextos sociais, geográficos e de segurança. “Desconsiderar a realidade de cada escola coloca em risco a vida e o futuro dessas crianças”, afirmaram mães de comunidades vulneráveis, em relatos marcados por emoção. A ruptura de vínculos afetivos com as escolas e a falta absoluta de diálogo também pautaram a reunião. 

Ao final, a secretária disse que “se dispõe a conversar com o prefeito Melo a partir da próxima segunda-feira”, alegando não poder tomar uma decisão imediata. Rosane rebateu: “Considerando quem esteve aqui hoje, não há como não se sensibilizar. Não podemos permitir a evasão escolar. É preciso levar em conta tudo o que foi dito.”

As representantes reforçaram ainda que a responsabilidade pela segurança, integridade e bem-estar das crianças é dever intransferível do Estado, que não pode se omitir diante de riscos concretos enfrentados pelas comunidades. Também foi apontada a participação e cumplicidade do prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, no avanço da municipalização, sem diálogo e sem considerar as consequências para as famílias.

Lembraram, ainda, que a educação é um direito humano fundamental e que sua garantia, como direito social, é cláusula pétrea da Constituição Federal, estando, portanto, acima de quaisquer legislações ordinárias estaduais ou decisões administrativas que atentem contra esse princípio.

O CPERS reforça que permanecerá ao lado das comunidades, lutando pelo direito à educação, pela segurança das crianças e pelo bem-estar de toda a comunidade escolar, exigindo que qualquer decisão sobre municipalização respeite aquelas e aqueles que vivem diariamente a realidade das escolas.

Além da presidente Rosane, participaram da reunião representando o Sindicato, o 1° vice-presidente, Alex Saratt, a secretária-geral, Suzana Lauermann, a diretora Joara Dutra, e os diretores, Luiz Henrique Becker e Amauri Pereira da Rosa. O advogado Marcelo Fagundes, representando a assessoria jurídica da entidade, também acompanhou a reunião.

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