Empobrecimento e falta de políticas públicas empurram jovens para fora da escola, afirmam especialistas


A evasão escolar no Brasil tem cor, gênero e endereço. O empobrecimento da população e a falta de políticas públicas na educação sob o governo de Jair Bolsonaro empurrou uma parcela de jovens para fora da escola, segundo especialistas entrevistados pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE).

Nos quatro cantos do país, são jovens, de baixa renda, negros/as e moradores de periferia que correm o maior risco de abandonar o ensino. “O Estado não dá nenhuma condição para que esses estudantes permaneçam na escola. Isso é complicado e grave, porque nós entendemos que a educação se dá a partir de três pilares: o acesso, a permanência, e as condições para permanecer estes alunos estudando”, diz a secretária de assuntos educacionais da CNTE, Guelda Andrade.

Em 2021, o Brasil registrou aumento no número de crianças e adolescentes fora da escola: 244 mil meninos e meninas de 6 a 14 anos não estavam matriculados no segundo trimestre – uma alta de 171,1% em relação ao mesmo período de 2019. Os números são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Estudantes mais pobres

Muitas crianças e jovens sobrevivem no Brasil com renda per capita de 1 salário mínimo, segundo o levantamento do Módulo Educação, da PNAD de 2019, divulgado pelo IBGE. Guelda afirma que a grande dificuldade dos/as alunos/as para permanecer na sala de aula é a questão financeira, como a falta de transporte e de estrutura para estudar.
“Esse estudante se sente muito abandonado, sozinho, e, às vezes, não tem nem equipamento para assistir às aulas. Isso é um processo que desmotiva os alunos a estudarem”, frisou Guelda.

O diretor de pesquisa e avaliação do Cenpec, Romualdo Portela de Oliveira, vai na mesma linha da dirigente. Ele avalia que esse quadro alto de evasão escolar não veio só com a pandemia de Covid-19, mas a crise sanitária gerou mais dois processos que pioraram a situação. Um, diz ele, é que a população empobreceu, a segunda, é que a crise econômica empurrou muitos estudantes para fora da escola.

“A evasão escolar é essencialmente um processo de rompimento dos vínculos com a escola, isso pode ser uma coisa substantiva. Há uma parcela que já está fora e os que, com a pandemia, perderam completamente o contato com a escola. O grande fator para que os alunos abandonem a escola é a perda de renda”, analisou.

Evasão desigual e política excludente

O avanço da evasão escolar está ligado às questões raciais, gênero e socioeconômicas, como mostra um estudo do Observatório da Educação. Enquanto pessoas brancas e de renda alta alcançam os maiores índices de escolaridade, já pessoas negras e de renda mais baixa tendem a ter um menor índice de avanço escolar. Segundo o PNAD referente ao ano de 2015, quando a família do aluno é chefiada por homem branco, com pelo menos a escolaridade média completa, renda alta e residente de área urbana, a chance deste aluno frequentar a escola normalmente é de, 79%. Já na hierarquia de raça, quando se trata de famílias chefiadas por mulheres negras, analfabetas e da área rural, esse índice é de 65% no Estado do Maranhão, e de 21,7% em Santa Catarina.

As meninas têm outros motivos para abandonar escola

A gravidez precoce afasta também as meninas adolescentes da escola, relembra a dirigente da CNTE, Guelda Andrade, que coloca o machismo exacerbado na sociedade como um dos fatores desse distanciamento. “Até porque nessa sociedade o filho é da mãe, e não do pai, que não tem responsabilidade com a criança. Se ela engravidou, tem que assumir, então tem as limitações que normalmente o pai não assume nem no afeto e nem no financeiro. E a mãe se vê numa condição extrema de sobrecarga emocional e deixa de ir à escola”, finaliza.

Medidas sociais para inclusão

No Plano Nacional de Educação (PNE), lei aprovada em 25 de junho de 2014, está prevista uma estratégia para a universalização da educação para a população entre 4 e 17 anos, a busca ativa dessas crianças e adolescentes fora da escola.

A busca ativa é uma forma de chegar até as pessoas que, seja por desconhecimento, dificuldade ou outros impedimentos, não têm acesso à escola ou demais serviços públicos, em parceria com órgãos públicos de assistência social, saúde e proteção à infância, adolescência e juventude. Veja no site www.deolhonosplanos.org.br exemplos de como esse tipo de política vem combatendo desigualdades.

No último dia 22 de agosto, o município de Rio Branco, capital do Acre, instituiu a Busca Ativa Escolar (BAE) como política pública contínua, com intuito de atender às estratégias previstas no Plano Municipal de Educação, assegurando que o município deve promover a busca ativa de crianças e adolescentes em parceria com órgãos públicos de assistência social, saúde e proteção à infância.

“O acesso à educação de qualidade é um direito de todas as crianças e todos os adolescentes. E, ao acreditar que podemos transformar vidas e realidades por meio da educação, entendemos que a Busca Ativa Escolar é mais que um programa, mas uma política pública”, declarou o prefeito para o site do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

Segundo Romualdo de Oliveira, o Estado tem que promover políticas públicas para combater a pobreza e ajudar com auxílio financeiro para que estudantes permaneçam na sala de aula. “O que precisa fazer é a renda cidadã, basicamente para essa população que empobreceu. Se não garantir sobrevivência mínima, não volta para escola. A segunda coisa é que a grande maioria da população brasileira entrou e saiu da escola, portanto, se não mexer nas práticas da escola, vai continuar produzindo exclusão”, ressaltou o diretor de pesquisa e avaliação do Cenpec, que completou: “Temos que falar na escola das lutas antirracista e antissexista, e de políticas que falam com pessoas vulneráveis”.

>> Saiba mais: Pandemia ampliou desigualdade no ensino, evasão escolar e perda de aprendizagem

Fonte: CNTE

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