Conectados na luta: encontro de aposentados debate consciência negra, reforma administrativa e conjuntura


O movimento negro no Brasil, os impactos da Reforma Administrativa, conjuntura e novas tecnologias foram alguns dos temas debatidos em reunião virtual com mais 80 aposentadas(os) dos núcleos de Lagoa Vermelha (25º) e Porto Alegre (38º e 39º), com a participação de convidados dos núcleos de Bento Gonçalves (12º) e Santiago (29º).

A atividade – que ocorreu nesta sexta-feira, 20 de novembro, Dia da Consciência Negra – integra a agenda de mobilizações promovida pelo Departamento de Aposentados(as) do CPERS, que desde o início da pandemia debate a luta e leva informação aos 42 núcleos do Sindicato.

Antes de iniciar a reunião, a diretora do Departamento, Glaci Weber, homenageou as mulheres que entraram no pleito deste ano e exibiu uma apresentação de dança das aposentadas do núcleo de Estrela (8º).

“É uma satisfação estarmos todos juntos, mesmo que virtualmente. Quero homenagear as mulheres que participaram dessas eleições. Também gostaria de agradecer a vocês pela coragem, pela paciência e por fazerem a luta”, afirmou. 

Durante todo o encontro, os presentes lamentaram o brutal assassinato de  João Alberto, homem negro de 40 anos, espancado por seguranças no Carrefour na véspera do Dia da Consciência Negra.

“Lamentavelmente um homem negro, pai de família, foi assassinado. A gente sabe que através de luta e resistência haveremos de combater o racismo. Declaramos toda a nossa solidariedade ao povo negro”, declarou a diretora Alda Maria Bastos Souza, abrindo a reunião

Para a 1ª vice-presidente do CPERS, Solange Carvalho, crimes contra a população negra acontecem quase todos os dias, mas nem sempre são noticiados. “Hoje é um dia que caiu como uma bomba. Os crimes contra negros e negras acontecem quase todos os dias e não ficamos sabendo. Dessa vez, só soubemos porque tinha alguém filmando. Essa é mais uma luta que temos que afirmar. Também temos que batalhar contra a violência e o feminicídio. Temos que batalhar para que as escola não sejam um espaço de reprodução do preconceito”, asseverou.

“Hoje amanheci triste em relação ao que aconteceu. Quando ocorreu aquela morte hedionda nos EUA, nós pensamos até quando o ser humano ainda vai praticar esse tipo de atrocidade? A consciência negra é todos os dias. Isso nós como educadores e educadoras precisamos fazer essa reflexão no nosso dia a dia, nas nossas falas”, afirmou a diretora Rosane Zan.

Para a diretora Sonia Solange, hoje seria um dia para comemorar a vitória dos colegas negros que se tornaram vereadores, mas a categoria está lamentando a morte de João Alberto. “A gente não gostaria que essas coisas acontecessem. Por isso, temos que cada vez mais essa luta contra esse absurdo”.

A secretária-geral Candida Rossetto destacou que o Dia da Consciência Negra serve para lembrar que todas as vidas importam. “Hoje representa uma luta contra o preconceito especialmente aos negros. Temos desafios homéricos na tentativa de derrubar os governos Leite e Bolsonaro que atacam nossos direitos. Que a partir desse encontro possamos fortalecer a luta para romper com o projeto neoliberal em curso”.

Já o tesoureiro Mauro João Calliari frisou que a luta antirracista é de toda a sociedade. Infelizmente hoje amanhecemos com essa notícia que ocorreu em Porto Alegre. Não basta não sermos racistas, precisamos ser antirracistas. Tenho certeza que não vamos esmorecer diante dessa luta”, afirmou.

“Está sendo um ano muito difícil. Entramos numa pandemia absurda, resistindo com as escolas fechadas e sobrevivendo nesse período. Ontem nos deparamos com esse absurdo que aconteceu com o assassinato de um negro, precisamos refletir muito sobre isso e o papel da educação pública sendo resistência”, frisou Christiane Ribeiro Gomes, diretora do 39º Núcleo.

É um momento muito triste, o Dia da Consciência Negra é uma comemoração mas tem que ser sempre uma denúncia. Educação é militância, é tomar partido, é acreditar na política, na democracia e em uma outra sociedade”, disse Érico Fernandez, diretor do 38º Núcleo.

Análise da conjuntura

Antes de analisar a conjuntura, a presidente do CPERS, Helenir Aguiar Schurer, criticou relativização do governador Eduardo Leite (PSDB) sobre a morte de João Alberto. Questionado sobre o fato, Leite afirmou tratar-se de um excesso.

“Quero dizer ao governador não se trata de excesso, é assassinato. Vemos acontecer em Porto Alegre o que acontece diariamente no Brasil. A luta do povo negro deve ser travada por todos aqueles que tem consciencia. É o que estamos fazendo na luta contra o racismo que é estrutural na nossa sociedade”, asseverou Helenir.

Sobre a conjuntura, a presidente afirmou que a política de Leite segue alinhada com a de Bolsonaro: “Aqui no Brasil temos um governo que continua nos envergonhando publicamente, com afirmações levianas, homofóbicas e machistas. Esse governo continua querendo nos retirar direitos, assim como aqui no estado.”

Helenir frisou ainda que pela mobilização massiva da categoria, em uma das maiores greves da história, as perdas foram amenizadas.

“Tivemos ataques, mas pela força da greve conseguimos manter o nosso Plano de Carreira. Quando alguém disser que perdemos tudo, reivindique a sua luta colocando na mesa a verdade de que a luta teve um resultado. No próximo ano, teremos reajuste do piso e todos nós seremos contemplados”.

Por fim, a presidente alertou que a base do governador ainda é muito forte, fato demonstrado nas últimas eleições. Por isso, é necessária a unidade na luta e consciência política.

“Nossa luta foi feita principalmente pelos aposentados. A base governamental foi muito bem votada. Vamos ter que lutar muito mais para mostrar a verdadeira face de Leite. Precisamos de um novo projeto para que possamos sentar e negociar. O governo atual não negocia. Precisamos lutar por um governo mais democrático e popular”, finalizou.

Impactos da Reforma Administrativa

“Hoje é o Dia da Consciência Negra e quero lembrar que nosso site tem muitos levantamentos sobre a população negra. Precisamos apoiar políticas afirmativas no nosso dia a dia para aplicar a mudança”, disse a economista Anelise Manganelli, técnica do Dieese, antes de explanar sobre a Reforma Administrativa.

Sobre a Reforma, Anelise explicou que esta se insere num contexto com projeto explícito de desmonte do Estado, com mudança estrutural na base econômica e tecnológica e mercantilização de direitos sociais. 

Neste contexto, estão os programas de privatizações, as reformas da Previdência e Trabalhista, que alteram as regras da previdência e CLT, e o decreto Terceirização no Serviço Público, que amplia as possibilidades de terceirização nas administrações direta e indireta. 

Sobre a tramitação da PEC 32, a economista explicou que esta foi apresentada ainda em setembro. A Frente Parlamentar Mista em Defesa do Servidor enviou ao STF um mandado de segurança solicitando a suspensão da tramitação, por falta de informações em especial ao impacto orçamentário.

“Houve muito questionamento em torno das justificativas que o governo não deu. Os dados que estão lá são altamente questionáveis. Há muitas dificuldades de sustentar essa proposta”, afirmou.

Em novembro, o ministro do STF, Marco Aurélio decidiu que cabia a Maia responder se a proposta enviada ao Executivo seria suspensa ou não. No mesmo mês, Maia respondeu que a PEC já está suspensa, pois não há previsão de início das deliberações.

Sobre a Reforma da Previdência estadual, Anelise explicitou que esta teve como base a Emenda Constitucional 103, em que foram autorizadas duas tabelas para o cálculo de desconto previdenciário, uma para a situação de equilíbrio atuarial e outra para déficit.

Conforme Anelise, isso significou que “o impacto na previdência atinge diretamente os servidores aposentados. Na prática, um servidor inativo que ganha 6 mil reais no regime da previdência estadual passa a ter um desconto de 10 por cento na aposentadoria”.

Para a advogada do escritório Buchabqui Pinheiro e Machado, Juliane Marchioro, o principal medo é que todas essas legislações vão dar um poder ao Executivo em um período que abre espaço às terceirizações.

“O concurso público vai virar algo em extinção. Será o término das carreiras”, afirmou.

O Sindicato também ingressou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn), junto com a União Gaúcha dos Servidores Públicos, a Ajuris e outros sindicatos, e ganhou a liminar no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ/RS). Mas o governo foi até o Supremo Tribunal Federal (STF), cassando-a.

Mesmo com a decisão, o STF ainda deve analisar o mérito da ADIn, interposta pelo escritório do ex-ministro Ayres Britto. O processo continua tramitando tanto no TJ/RS quanto no STF e aguarda julgamento.

“Esperamos que o judiciário proveja isso. Os aposentados não precisam entrar com ações individuais na Justiça com outros escritórios, pois todos os sócios estão abrigados na ação coletiva”, finalizou.

Movimento negro no Brasil 

O 2º vice-presidente do CPERS, Edson Garcia, explanou sobre a importância do Dia da Consciência Negra na luta contra o racismo para toda a comunidade negra. Edson também lamentou o assassinato de João Alberto e clamou por justiça.

“Hoje acordamos com o terrível assassinato de um homem negro dentro de um supermercado em Porto Alegre. Se não tivéssemos celulares, não veríamos o que aconteceu. Nós, que trazemos nossa ancestralidade, na cor da pele e nos traços, precisamos nos aquilombrar e travar nossas lutas”, asseverou.

Ele também destacou que a luta antirracista é de todos e que deve ser colocada em prática no nosso dia a dia.

“O antirracismo está presente nas ações. Sabemos que o homem e a mulher pretos vivem muito a partir da imagem que foi criada na nossa sociedade de violentos e agressivos. Temos que diuturnamente desconstruir esse estereótipo. O CPERS tem se engajado constantemente nessa luta com o Departamento de Combate Racismo, fruto da nossa gestão”, frisou. 

Edson também ressaltou a importância da Lei 10.639, que representa um avanço ao estabelecer que no Ensino Fundamental e Médio se instaurasse o estudo da cultura afro-brasileira e africana.

“A gente quer que as pessoas avaliem o que significou a presença africana para a construção do Brasil. Não existe história do Brasil sem o povo africano. Muitas vezes as pessoas ferem e são maldosas e esquecem que por trás existe um ser humano que teve seus antepassados escravizados”.

Por fim, o  2º vice-presidente ressaltou que Zumbi não lutou sozinho. Ele lutou junto de Dandara e destacou a força feminina dentro da categoria. “Nossa categoria basicamente é formada por mulheres e temos que destruir e descontruir esse racismo diariamente. Essa pauta antirracista faz parte desse movimento para que tenhamos uma vida melhor para nossas crianças. Somos um povo preto que resiste.”

Inclusão dos aposentados nas novas tecnologias 

O jornalista que coordena o setor de comunicação do CPERS, Luiz Damasceno, explanou sobre a inclusão digital para os aposentados(as).

Na ocasião, ele trouxe dados sobre a adoção dos meios digitais entre a categoria, as redes mais acessadas e a importância do engajamento político pelo meio digital.

De acordo com o jornalista, 55,2% dos educadores afirmam utilizar as redes sociais e a Internet para se informar sobre temas relevantes à categoria. O percentual dobrou depois de 2017.

Entre os aposentados, a proporção é de 43, 5%. “Ao contrário do que muita gente pensa, nossos aposentados estão acompanhando o que vem acontecendo. É um percentual bem significativo”, asseverou. 

Entre as redes mais acessadas pela categoria estão o Whatsapp (43,1%), o Facebook (37,1%), o Instagram (12,4%) e o Twitter (1%).

Sobre o Twitter, Luiz ressaltou que por mais que não seja uma rede de massas, ela abriga especialmente jornalistas, influenciadores e políticos, sendo uma importante ferramenta de luta.

“Para as pessoas que trabalham com informação, é lá que as coisas circulam. É uma rede importante para fazer pressão política. Nesse ano, a gente teve manifestações de grande impacto, como a vitória do Fundeb que mobilizamos junto com a CNTE.”

Por fim, Luiz destacou a importância da Rede CPERS, uma ferramenta criada pelo Sindicato de envio rápido de notícias pelo Whatsapp com mais de 10 mil contatos.

“As redes e a internet não servem só para entretenimento ou buscar informação, são ferramentas de luta, que podem ser usadas para ter bons resultados e impactar as pessoas”, finalizou.

Momento cultural 

No momento cultural, o encontro contou com a apresentação das irmãs Terezinha e Clara Madruga, as Irmãs Madruga, do núcleo de Santiago (29º), e também da exibição de dança típica da região italiana da Serra Gaúcha com as aposentadas do núcleo de Bento Gonçalves (12º).

 

“Quero agradecer ao convite para que o nosso núcleo participasse trazendo uma linda apresentação da Terezinha e da Clara com uma música muito inspiradora”, ressaltou o diretor do 29º Núcleo, Leandro Wesz Parise.

“Para nós é um orgulho participar desse encontro de aposentados. Mesmo com a pandemia, nosso núcleo continua com as atividades com os ensaios do nosso grupo de dança e do nosso coral, ambos feitos virtualmente”, afirmou a diretora do 12º Núcleo, Juçara de Fátima Borges.

 

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