Nota pública do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente


O CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – CONANDA, no uso da atribuição que lhe confere a Lei n° 8.242, de 12 de outubro de 1991 e o Decreto nº 5.089, de 20 de maio de 2004, como órgão formulador e controlador da política de proteção integral a criança e ao adolescente, vem manifestar total indignação em relação aos Projetos de Lei nº 7.180, de 2014 (principal), 7.181/2014, 867/2015, 1.859/2015 e 5.487/2016, apensados, que alteram dispositivos da Lei de Diretrizes e Bases para instituir o “Programa Escola sem Partido”.
Tal conjunto de proposições refletem a pauta conservadora dos órgãos do Poder Legislativo Nacional, Estadual, Distrital e Municipal que tem avançado sobre legislações que estabelecem direitos e garantias individuais, principalmente no que se refere aos direitos de crianças e adolescentes.
Sob a justificativa de que professores e autores de livros didáticos estão usando suas aulas e obras a fim de obter a adesão dos alunos a determinadas ideologias, os projetos de lei citados – cujos congêneres já circundam também as casas legislativas estaduais e municipais – vão na contramão de princípios constitucionais já consagrados, incluindo o pluralismo de ideias e a liberdade de cátedra. Tais projetos procuram minar a função primordial do professor no processo de aprendizagem e também a função da educação como instrumento de formação crítica e cidadã.
Ao defender de maneira abstrata e retrógrada a “neutralidade ideológica” do sistema de ensino, os mentores da “Escola sem Partido” ocultam suas reais intenções de combater as transformações sociais ocorridas no País na última década, que atingiram especialmente grupos historicamente oprimidos e invisibilizados.
Além disso, ao defender a supremacia das crenças familiares sobre os projetos pedagógicos definidos conforme a legislação vigente, permite a ingerência indevida do privado sobre o público, e rompe com a laicidade do Estado e a própria diversidade de ideias que afirma defender.
A Convenção dos Direitos da Criança, normativa internacional da qual o Brasil é signatário, impõe como obrigação aos Estados-partes garantir que a educação em seus territórios seja orientada para desenvolver a personalidade, as aptidões e a capacidade mental e física da criança em todo seu potencial, imbuindo-lhe o dever de respeitar os direitos e liberdades fundamentais de toda a sociedade. A educação deve preparar a criança para assumir uma vida responsável numa sociedade livre, com espírito de compreensão, paz, tolerância, igualdade de sexos e amizade entre todos os povos.
A Carta Política de 1988 destaca, por sua vez, entre os princípios a serem seguidos pelo sistema de ensino, a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber, e o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas.
Nesse sentido, a narrativa de pluralidade construída pelos defensores do programa Escola sem Partido já encontra arcabouço legal suficiente no ordenamento jurídico atual. Isso revela, mais uma vez, o conteúdo obscuro e autoritário das proposições em trâmite no Congresso Nacional. Tais projetos visam confundir a opinião pública para, ao final, impor sobre o espaço da escola uma visão de mundo e sociedade excludente e discriminatória.
O espaço da sala de aula deve representar um local de reflexões e liberdade de pensamento, possibilitando que crianças e adolescentes possam fazer a conexão da teoria com a realidade social. Nas palavras de Paulo Freire: “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar possibilidade para a sua própria produção ou a sua construção”.
O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e Adolescente permanecerá vigilante e atuando na defesa irrestrita dos direitos de crianças e adolescentes, enfrentando as tentativas de violações a estes direitos.

Brasília, 11 de agosto de 2016

Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA

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